“No princípio criou Deus o céu e a terra e a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face da do abismo; e o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas. E criou Deus o ser humano à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.” (Gn.1:1-2, 27)
Temos acumulado experiências que nos fazem perceber o tempo como uma demarcação humana que delimita passado, presente e futuro. Assim temos aprendido e o calendário cristão é um ótimo exemplo disto. Diversas tradições cristãs têm no calendário cristão a contagem do tempo que gravita em torno do nascimento, da vida, da morte e da ressurreição (e ascensão) de Jesus, o Cristo da Ruah. Entretanto, parentes indígenas há muito compreendem e ensinam que, na verdade, o tempo é ancestral. O espiral é o texto imagético que nos ajuda a compreendermos esse conhecimento ancestral, pois evidencia a circularidade como movimento evolutivo; superando a tendência ao aprisionamento da experiência apenas cíclica, de repetições de padrões.
Faço citação de alguns versículos do primeiro capítulo do livro bíblico do Gênesis, para aludi-lo como uma narrativa sobre as origens de tudo o que existe. Ao fazê-lo, reconheço que há inúmeras narrativas sobre as origens em outras tradições religiosas anteriores ao Judaísmo e ao Cristianismo, e, sobretudo, nas experiências de espiritualidades dos povos originários. No meu fazer teológico tenho reconhecido a Teologia – que em sua etimologia (estudo sobre a origem da palavra), expõe a pretensão humana de estudar Deus, como se nós, criaturas de Deus, tivéssemos alcance para dissecar sua imanência e sua transcendência; como narrativa sobre as experiências humanas em relação ao Sagrado. Assim, proponho aqui um exercício teológico que evidencie e valorize a plenitude da existência plena das pessoas a partir de narrativas bíblicas que afirmam a plenitude da vida humana, para com isso ressaltar que nós mulheres somos imagem e semelhança da Ruah, tanto quanto são os homens.
Ruah é o nome que costumo usar para me referir à Força Criadora, à Energia geradora de tudo que existe, comumente chamada de Deus e de Espírito de Deus (Espírito Santo). Faço-o como exercício contínuo de desconstrução do aprendizado que me fez pensar nessa Força Criadora a partir de um modelo único: o masculino. Ruah, palavra hebraica de origem feminina presente nos textos no Primeiro Testamento desde o livro de Gênesis, foi traduzida como Espírito, palavra masculina que moldou o modo como a narrativa teológica sobre Deus foi (e continua sendo) ensinada pela ortodoxia (doutrina) cristã. Ortodoxia que faz convergir a diversidade de tradições cristãs, silenciando o que aprendemos do diálogo teológico entre Jesus e a mulher samaritana:
“Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade”. (João 4:24).
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